"Começamos oprimidos pela sintaxe e acabamos às voltas com a Delegacia de Ordem Política e Social, mas, nos estreitos limites a que nos coagem a gramática e a lei, ainda nos podemos mexer"
Graciliano Ramos

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Transeuntes

Enjoado da monotonia do novo ano,
Horácio foi à praça á tarde folhear seu livro velho.
E entredito pela leitura, deixou o relógio correr.
Foi ao perceber uma leve brisa, dessas de verão
que Horácio viu-a:


Com uma blusa verde de mangas regatas
e sapatilhas beges, o seu amor descia
em direção ao banco; tinha curtos cabelos alaranjados,
belos como a luz do sol, que atraiam a atenção até
dos objetos mais inanimados.


Pois que Horácio apaixonou-se pela transeunte.
Era linda! De proporções exatamente perfeitas.
Não vira seu rosto, mas sabia –sentia– que ela era a Vênus
de madeixas incandescentes que ele sempre procurara.


 Sabia perfeitamente que era ela
a Deusa de sua até então indefinida existência.
Pois então que a paixão fez com que Horácio permanecesse
sentado, a esperar que ela passasse;
E passou! Duas vezes, sem ao menos olha-lo,
 seguida pelo olhar dele, já em êxtase.


Mas tudo era breve, inclusive os momentos
em que a Deusa dos cabelos em brasas aparecia.


E o dia fez-se breve também;
e logo anoiteceu;
e a praça esvaziou-se;
deixando apenas os múrmuros
das folhas ao vento...


Ora, Horácio; pobre Horácio... Iludira-se mais uma vez
nas grandes galerias da paixão por uma transeunte.


Passou-se então o dia e o novo ano já não era tão
monótono como ontem...
E a Deusa loira, com seu vestidinho listrado,
caminhando lentamente
entre as estantes do mercado o maravilhara.


Ah, como era bela aquela loira; como Horácio a amava... 

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